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segunda-feira, agosto 31, 2009

Antes ser a outra?


Surpreendo-me ao atender o telefone e ouvir a voz de Flor - afinal, ela deveria estar viajando. Quando nos falamos na última vez estava esfuziante, animada, transbordando alegria. Alegria demais, como comentei então. "Nina, você é sempre assim, vê coisas onde elas não existem! Não, não estou triste. Sim, está tudo bem. A vida é bela, amiga, e o amor é lindo. E vamos, Moreno e eu, passar o fim de semana em Maceió, namorando, curtindo a praia, o amor, um ao outro. Não queira estragar isto, ok? Não me critique, não me questione, me deixa ser feliz!" E desligou o telefone pra terminar de arrumar a mala, ir ao salão, se preparar, enfim, pra um fim de semana idílico com seu amor de longa, longuíssima data. Isto aconteceu na quarta feira, há dois dias.
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- Oi, Flor! O que aconteceu? Você não deveria estar em Maceió???
- Ah, Nina... preciso taaaaaaanto de você... não diga nada, por favor, não suportaria... preciso de alguém que me ouça, que me entenda, que me dê colo...
Então, algo deu errado. O que ela não percebe é que eu não consigo entender, que mais que ouvi-la queria que ela me ouvisse, que só ofereço meu colo em nome de nossa amizade, ainda mais antiga que este romance absurdo que se tornou o centro de sua vida...
- Não chore, Flor. O que aconteceu?
- Não fomos, Nina. Deu tudo, tudo errado. O peste do Pedro quebrou o braço num jogo de futebol, e pediu que o pai ficasse com ele, e você sabe como Moreno é louco por esse menino, faz tudo o que ele quer...
Ai, ai, minhamiga, minha querida amiga. Moreno é louco pela família dele - esposa, filho, filha. E é isso que eu queria tanto, tanto que você percebesse, a fim de que pudesse buscar, enfim, ser feliz - e quem sabe construir sua própria família!
- Acidentes acontecem, Flor... são coisas fora de controle, não são planejados...
- Ah, mas eu tenho certeza que aquela bruaca da mulher dele desconfiava... ela deu um jeitinho de atrapalhar tudo, eu sei!
- Flor...
- Ah, Nina, vem aqui em casa, vem... por favor, por favor, por favor!!!! Preciso de você, amiga, preciso tanto!
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Abre a porta com olhos inchados e vermelhos - sinal de que já esgotou um tanto da dor nas lágrimas derramadas. Coloco no chão as sacolas de mercado e abro os braços pra acolher esta minha amiga tão querida num abraço que busca aquecer seu coração, lavar sua alma, aliviar sua dor...
- Vai, vai tomar um banho daqueles de lavar a alma. Olha, eu trouxe aquele sabonete energizante que você gosta tanto... vai, não discute, enquanto isto eu vou arrumar algo pra gente comer - mesmo que você não tenha fome, lembra que eu trabalhei o dia todo e tô faminta! E você vai comer comigo, afinal desmarquei meu jantar com Amor pra ficar com você, não vai me deixar comer sozinha agora!
Sei bem como agir, afinal não é a primeira - e infelizmente não será a última - vez que venho socorrê-la num momento assim, o que me dá know how suficiente pra agir com segurança e desenvoltura sem medo de feri-la ainda mais. Amor também não consegue entender como é que ela, uma mulher bonita e independente, fica refém desta relação tão desigual e infrutífera - mas entende que ela é uma grande amiga, que precisa de mim, e vai pro jogo de poquer que sua galera do trabalho marcou hoje à tarde, quando já tínhamos combinado um jantarzinho romântico (chego a desconfiar que com uma alegria um pouco maior do que a desejável)...
Enquanto ela se arrasta para o banheiro, vítima infeliz relegada pelo amante a segundo plano, lavo a louça na pia, coloco o sorvete e o vinho no freezer, a pizza no forno, não sem antes procurar o CD especial que gravei em seu último aniversário... Ivan Lins cantando Vitoriosa é o fundo musical pra melhorar o seu astral, depois Ney Matogrosso, Skank, Cidade Negra, uma seleção sui genêris e especial pra minha amiga...
Vinho, pizza, música, sorvete - e meu silêncio, que hoje é dia só de ouvir, não de falar. Deixo que ela desabafe, que derrame as poucas lágrimas restantes, que se perca em autocomiseração e ofereço meu colo, meu abrigo, a amizade de sempre e a paciência -agora rara. Acomodo-a na cama, embriagada em abandono, tristeza e vinho, e vou ao filme que tinha locado no horário de almoço, "odeio o dia dos namorados". Nada mais adequado.
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Sábado pela manhã Flor se levanta tarde, de ressaca. Olhos inchados, olheiras, pele sem viço. À mesa já um café da manhã de sábado: fruta, suco, ovos, aipim, calabresa, torradas. Ela vem arrastando os chinelos, ombros caídos, senta-se diante de uma xícara de café quente e me olha com aquele jeito de quem pede clemência, não, não fale nada, eu não mereço ouvir. Ah, merece, Flor. Merece sim. E vai ouvir. Este é o preço - tudo na vida é troca, tudo tem preço, não tem? Até a amizade.
- Não entendo você, juro. Eu tento, tento mesmo, do fundo do meu coração, mas não consigo entender - tampouco aceitar - o que você faz consigo.
- Não, Nina. Agora não. Por favor, dá um tempo.
- Sinto muito, Flor. Não dá pra esperar. Há quanto tempo você vive esta situação, mulher???? São dezoito anos, uma vida, complentando maioridade! Tá na hora de você adquirir juízo!
- O que eu posso fazer se o amo?
- Ama? Ama mesmo? Que amor é este, maior do que o que sente por si? Como é que você quer que ele a ame, se você não se ama?
- Pra você é fácil falar, Nina. É linda, bem resolvida, tem Amor a seu lado, que faz tudo o que você quer, que está sempre com você, que chega a dar inveja do fato de vocês serem, por vezes, odiosamente felizes!
- Flor... pára. Não é essa a questão - e você sabe. Você é linda, é independente como eu... e eu e Amor nos conhecemos e construímos uma história um com o outro...
- Mas eu também! Também eu construí uma história com Moreno, e uma história linda...
- Que história linda, Flor??? Ele tem outra história, é casado, CA-SA-DO, tem filhos...
- Amor também tem filhos!
- Sim, Flor. Amor tem filhos, e eu também. Mas de outras histórias, que aconteceram e acabaram antes de nos conhecermos... quando volto pra casa à noite, ele está lá, ao meu lado. Em nossos aniversários - de nascimento, de relacionamento - estamos sempre juntos pra comemorar. Ele está comigo nos natais, nos reveilons, nos dias dos namorados e em qualquer momento que preciso... é meu companheiro de verdade, amiga. Moreno nem ao menos seu aniversário passa com você!!!!
- Ah, mas que culpa ele tem se a filha faz aniversário no mesmo dia que eu????
- Até quando, minha amiga, você vai buscar desculpas pra justificar o egoísmo dele e sua infelicidade??? Quantas vezes isso já aconteceu antes, Flor? Quantos foram os planos abortados porque um filho se machucou, porque a sogra chegou sem avisar, porque os cunhados vieram passar o fim de semana de surpresa???? Quantos natais sozinha, sem ele? Quantas vezes você precisou dele ao mesmo tempo que a mulher, e ele nem titubeou em deixar você se virar só? Não vou mais, prometo, falar de princípios morais, de como sua mãe se sentiria se descobrisse, de como sua família reagiria... não tenho mais estes argumentos, acabaram. Mas não dá pra ficar olhando calada você se acabando.. Tem quarenta anos, minha amiga. Abriu mão de filhos, de carreira em outro estado pra ser a outra... e o que ganhou com isso, além de momentos fugazes com ele??? Sei que acreditou que conseguiria um dia, tê-lo pra si... que investiu nisso esses anos todos... mas não tá na hora de pensar um pouco em você??? De buscar ser feliz??? Não tá na hora de parar de se contentar com migalhas, Flor?
- Eu o amo... não sei viver sem ele, Nina.
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Que triste olhar esta pessoa que amo tanto, esta mulher linda e bem sucedida profissionalmente tão entregue assim. Lembro de como um dia de bom humor ela me contou, rindo, sobre uma sua comunidade no orkut: "antes ser a outra do que ser a trouxa" - e penso, tristemente, se ela se deu conta de que desempenha os dois papéis títulos aí...
Sei que não adianta falar - esta é a escolha que ela fez, ser a outra, se contentar com migalhas, com o anonimato, com encontros furtivos, com viagens esporádicas, momentos efêmeros que sustentam um sentimento incompreensível pra mim - e talvez seja esta, afinal, sua maneira de ser feliz - viver em preto e branco olhando outras vidas em cores - afinal quem disse que preto e branco não tem sua beleza???
Triste maneira de ser feliz.

sábado, agosto 29, 2009

Marisia

Meu amor em Salvador - o apartamento me parece grande demais apenas pra mim.
Livros na fila, aguardando pra ler, mais de cinco.
Filmes sobre o dvd, quatro.
Papéis da diferença a procurar espalhados pelo chão.
No cavalete, uma tela inacabada.
Alguns textos iniciados, outros na cabeça.
Dois pufes de pet montados, faltando acabamento.
A mudança de Paula toda fora das caixas, esperando pra ser reorganizada (ah, essa cidade e seu bolor eterno...).
Uma máquina de costura para estrear - reformas, tecidos esperando, espalhados sobre a mesa.
Uma pilha de roupas para passar.
Fotos para organizar.
Vontade de fazer nada.
O sábado corre assim... morgando frente à TV, cochilando no tapete, pequenas visitas à net, lanches sem horário, compromisso com nada - a não ser comigo.
Acho que, afinal, precisava de um dia assim.

domingo, agosto 23, 2009

"Querido diário"


Este sábado começou todo errado, apesar das expectativas de ser especial.
Acordei pouco depois das seis, numa marisia sem fim. Arrumei a mochila pra ir pra Salvador, e cheguei na rodoviária poucos minutos depois de o expresso de 07:10 ter partido - então, peguei uma moto para ir até o teminal do Jacaré (o mocinho do balcão de passagens garantiu que eu conseguiria!), mas não deu. E o pior: chegando lá, descubro que tinha esquecido o celular em casa. Na mesma garupa, volto em casa, pego o celular e caminho novamente pra rodoviária, a tempo de pegar o ônibus (pingapinga) de 07:50, que chega ao Bom Despacho às 09:40 - os portões para pegar o Ferry das 09:45 ainda estavam abertos, mas não vendiam mais bilhetes, o próximo só 11:15. Não estava disposta a esperar uma hora e meia, pego uma moto e vou pro terminal das lanchas em Mar Grande. Merda!!!! Maré baixa. A próxima lancha só sairia 12:30. Eu mereço, eu mereço. Na mesma garupa (isto tá ficando chato), volto pro Bom Despacho. Em frente ao Bom Preço, resolvo descer pra comprar um lanche, já que o próximo ferry é só às 11:15. Bom. Com toda calma compro barras de cereais, iogurte e um livro de Agatha Cristhie (O Mistério da Arca Espanhola e Outras Histórias, que ainda não li) e vou caminhando sob o sol até o terminal do ferry. Quando chego no guichê a mesma menina que me atendeu antes, afirmando que o próximo ferry seria às 11:15 sorri e pergunta: "não quis ir no extra das 10:10???". Controlo minha vontade de socá-la através do vidro, e respondo meio blasé: "não, fui passear por aí, aproveitar esta manhã de preguiça." Engulo minha vontade de dizer um monte de besteiras, de ser grosseira, de ser irônica e vou me sentar lendo meu livro novo, o que é algo de bom nesta manhã torta.
Quando chego à casa de Ramon, ele tá limpando a bateria sob o sol, que já não está mais aprazível, e sim escaldante - me esquivo de ficar fazendo companhia, e subo pra um banho que lava os cabelos, o corpo, a alma. Passou. O dia vai melhorar, eu sei. Afinal, vou ao show do Roupa Nova, meu melhor presente de aniversário. A M O Roupa Nova. E de bônus, Zezé de Camargo e Luciano. O dia vai, sim, ser Shump. Não posso desacreditar, mas... já prontos, ficamos quase uma hora DE PÉ no ponto de ônibus que chega cheio de gente, afinal, além do show no Wet'n, pra onde vamos, tem algum outro grande evento musical no Parque de Exposições, no mesmo caminho. Então, continuamos de pé. Detalhe: o show também é de pé. Já estou irritada antes mesmo de chegar, mas conto até dez, e de novo, e Ramon é um poço de paciência comigo.
Ao chegar descubro que a patrocinadora oficial do evento é a Schin - não vou tomar cerveja, o que também me irrita um pouco mais. A banda que vai fazer a abertura do show é Seu Maxixe, pelo que entendi - uma banda 'sertaneja universitária' muito, muito boa. Não a conhecia, mas gostei muito, os meninos tem suingue, são animados, tem um bom repertório e segundo Ramon, que entende da coisa, tocam bem - apesar de o vocalista não ter molejo nenhum pra dançar! Gosto, me animo e até danço com eles - quando do nada, começam com antigos sucessos. Tocam "Fio de Cabelo". Algumas coisas, pra mim, são inconscientes e incontroláveis. Estava ouvindo a música encostada em Ramon, e só percebi que estava chorando quando as lágrimas caíram no meu braço. Que coisa idiota, isso, não é? Não, não é. É complicado, é difícil, é constrangedor às vezes, mas não é idiota. Esta é uma das músicas que mais fortemente lembram meu pai, e que ainda não consegui ouvir sem chorar. Disfarço, seco as lágrimas, mas elas voltam - e meu bem percebe, ele sabe como me sinto, e me abraça forte, o que aumenta a vontade de chorar - mas consigo me controlar, e penso comigo mesma: "tomara que Roupa Nova toque antes de Zezé.". Pressinto que terei dificuldades.
E assim é, começa "O" Show. Roupa Nova é tudotudotudo de bom, os caras são o máximo no palco, e tocam muuuuuuuuuuuuuito (opinião de quem entende!) e eu me acabo dançando e me divirto muito e fico muito feliz por poder estar ali. As brigas, por tentativa de furto, são um capítulo à parte - não sei quantas houve ao total, mas só do nosso lado foram três (eu mereço!).
Termina o show, e ele voltam ao palco a pedidos, com uma canja de grandes sucessos de rock que empolgam a galera, e nossa! Foi muito bom. Quero mais.
Enquanto esperamos Zezé e Luciano (e só vão chegar perto de duas da manhã, estão vindo do Rio, estavam se apresentando ao vivo no Criança Esperança) vamos lanchar, uma pizza de cone bem boazinha. O show começa e ficamos um pouco mais longe do palco - mas quando eles começam a cantar não consigo pensar em nada a não ser que Wan adoraria estar ali, e eu adoraria que ele estivesse, e putz, que meleca, não trouxe o celular por medo de assalto, e
P R E C I S O falar com ele, ligar no outro dia não ia fazer o mesmo efeito... então, com minha grandecíssima cara de pau olho pra moça que tá do meu lado e tem uma bolsinha à tiracolo... "moça, por favor... perdi meu celular (Deus há de perdoar essa mentirinha!)... e meu irmão, que mora em Goiânia, é fã de Zezé e Luciano, e eu precisava MUUUUITO ligar pra ele, é a cobrar, será..." nem preciso continuar a ladainha, ela é um doce, tira o telefone e me entrega: "após o sinal, diga seu nome e a cidade de onde está falando: sua irmã, de Salvador, direto do show de Zezé de Camargo e Luciano, pensando em você cara!!!". risos... acordo meu irmão, que é tudo de bom na vida, e entende que eu precisava falar com ele, afinal è Zezé e Luciano no palco, e isto é a cara da nossa família, dos churrascos, do churrasqueiro, ele entende que eu o queria aqui, que sinto saudade, e conversa na boa (bom... isso não é novidade entre nós, né? Só que geralmente ligamos quando estamos dois ou mais irmãos reunidos, bebendo todas e comendo churrasco, e um pobre incauto não pôde se reunir aos outros... rssss).
Agora sim - posso curtir o show, que começou com músicas atuais da dupla, que logo percebeu que na terra do axé não são conhecidas, e começam a resgatar sucessos antigos de seu repertório- o que é péssimo. Mais uma vez me descubro chorando (eita mico!)... e percebo algumas pessoas a me olhar curiosas, e sei, no fundo do meu coração, que não vou conseguir ficar até o fim sem me deixar invadir pela melancolia... melhor ir embora, já valeu a pena, foi tudo de bom. E o dia que começou torto pra caramba acabou bem. Certinho, feliz, aconchegada no abraço do meu amor.

sexta-feira, agosto 21, 2009

Entre junho e setembro...


...são quatro meses.
De 25 de julho a 24 de setembro, 122 dias e seis aniversários.
Uma mãe canceriana, um pai leonino, três filhos idem, um libriano.
Uma família comum, uma grande família comum, mas tão especial ao mesmo tempo!
Discussões, brigas, desavenças. Qual a família que não tem????
Em compensação tanto amor, mas tanto amor, tanta amizade, tanta união que nem sei descrever.
Uma família meio doida, meio maluca, hoje toda espalhada pelo Brasil, e que todos falam alto, dão gargalhadas desbragadas, contam piadas, bebem todas, choram de tristeza, choram de alegria, se abraçam, dão beijos quando chegam, dão beijos quando saem, se reúnem sem programar, se reúnem programando, aprendem com os erros e com os acertos, não tem medo de pedir perdão, não tem medo de serem felizes. E sabem que a felicidade não é todo dia, nem toda hora, mas é sempre.
Uma família em que os filhos cresceram e seguiram, cada um, seu caminho. E arrumaram parceria pra vida, e fizeram filhos (ops! Falta uma...), e o amor era tão grande que continua nos filhos, na relação entre primos, entre tios e sobrinhos, entre netos e avós, entre cunhadas e noras e genros e sogra... uma grande família que não perdeu a essência da vida, que não se perdeu - mesmo com a partida dolorosa do pai pra outra vida, outra esfera de crescimento. E que hoje, estivesse entre nós, completaria 68 anos.
21 de agosto, 2009. O segundo aniversário em que não está conosco. E ainda dói tanto sua falta, dói tanto a consciência de não mais poder ouvir seu riso, suas canções cantaroladas baixinho, suas histórias, suas teorias genéticas, o arrastar de seus chinelos pela casa, dói tanto não poder dar um abraço gostoso de feliz aniversário e não poder mais brigar pra não comer tanto doce...
21 de agosto, 2009. Mais um dia aprendendo que se pode ser feliz mesmo na dor.
Eu te amo, papai. Seja onde for que estiver, não esqueça: nós te amamos. E mesmo com sua falta, seguimos em frente - como o senhor queria. O que nos acalenta não é mais sua presença - mas a certeza de que Deus o cuida por nós.

quinta-feira, agosto 13, 2009

13/08/09


São quarenta e cinco aniversários.
Quarenta e cinco anos novos - e em cada um deles estava, sempre, cercada de gente.
Do primeiro só me lembro por foto, uma menininha rechonchudinha de pernas grossas, cachinhos fartos e sorriso aberto cortando um bolo maior que ela juntos aos pais - um casal de cinema, tão lindos eram!
Os outros todos, impossível lembrar cada um - quinze anos, claro, inesquecível: três festas! Uma, no dia, com direito a banho de farinha e ovos; uma 'discoteca' surpresa no sábado e, depois, o baile. O primeiro baile de debutantes do Floresta Clube, que reuniu uma galera considerável - mas que deu muito trabalho... lembro-me como hoje a Tânia, acho que este era o nome, no trabalho de formiguinha convencendo a cada uma das meninas de isso não era antigo, não era "demodê", e no fim, todas curtindo de montão algo que não queríamos e com certeza não pensávamos curtir assim. Gosto de olhar as fotos e ver o brilho nos olhos de cada uma, prontas pra abraçar a vida. Gosto de (re)encontrar nas fotos aquela menininha de pernas grossas e sorriso aberto e franco que acreditava que o mundo era todo dela, só esperando que ela saísse e estendesse as mãos, tomando conta... gosto de constatar, pelas fotos, que a amizade verdadeira persiste e resiste a tudo. Gosto de olhar a foto em que estamos, eu e Ly, encarando a lente sem medo do futuro, e gosto mais ainda por sentir, em meu coração, que o amor que nos uniu na adolescência não morreu e, mesmo com o passar do tempo e com a distância nos reconhecemos e nos entendemos como se tivéssemos nos visto ainda ontem num daqueles papos recheados de risadas, confidências, sonhos e verdade...
Outro aniversário bem claro na memória foi aquele em que Paulo, superando toda e qualquer expectativa, organizou uma festa - tão, mas tão bem organizada que, de verdade, acho que foi a única vez na vida em que a expressão "festa surpresa" funcionou comigo... tive uma festa realmente surpresa (e ainda paguei mico, reclamando dos amigos todos que não tinham se lembrado - e estavam todos quietinhos, reunidos, numa sala escura e cheia de gente... rssss)...
Lembro ainda o primeiro aniversário na ilha, quando só Maya morava comigo: mas a "festa surpresa pra Lu, do BB", teve direito a anúncio no rádio a manhã toda (êêê, Domingão!!) e foi cheia de gente, alegria e pranto (é, eu não mudei - alegria me faz, sim, chorar)... tantos, tantos!!! (É, claro que são muitos: quarenta e cinco! Com mais de uma festa em alguns, posso contabilizar aí uns mais de cinquenta... rsssss) - mas sempre, em qualquer época, estava rodeada de gente. Cercada por pessoas de amor recíproco - que me amavam e a quem eu amava - amigos, família, amores.
E nunca, em tempo algum, consegui sequer imaginar que um dia passaria a noite do meu aniversário sozinha - euzinha, com mamãe em Goiânia, três irmãos (cada um em um canto), sobrinhos, três filhos paridos e um do coração, amigos que me faltam dedos pra contar e um amor... sozinha, num aniversário? Jamais. E se, em algum momento essa idéia passasse por minha cabeça, tenho certeza de que só a perspectiva me faria cair em prantos (é, a tristeza e a melancolia também me fazem chorar....).
Mas eis que hoje, 13 de agosto de 2009, completo quarenta e cinco anos. Sozinha em minha casa com algumas latas de cerveja e o notebook. Não, o surpreendente não é ter acontecido - é eu não estar me afogando em lágrimas e autocomiseração. Tá, tudo bem, tive uma festa no fim da tarde, no trabalho. E outra marcada pra sábado, no lugar onde hoje mora meu coração. Acho que só isto ameniza o fato de que, pela primeira vez na vida, estou acampada em um lugar onde não cativei ninguém, onde não fiz Amigos - porque se os houvesse feito, não deixariam nunca que eu passasse a noite do meu aniversário solitária em frente ao computador. E o que dói é essa constatação clara e precisa de que realmente mudei - não sei se pra melhor ou pra pior, mas quando penso que não tenho amigos neste lugar me pergunto se é porque me tornei mais seletiva ou mais chata. Toda moeda tem dois lados, e toda verdade vários ângulos... mas, enfim, 'i'll survive'.
Não sei se amadureci, não sei se endureci, mas... incrivelmente, não me desmancho. Canto com o IRA! e Paralamas, em altos brados, a canção que amo e me faz bem.
Feliz aniversário prá mim.

quarta-feira, agosto 05, 2009

Ly, queridamiga, companheira e quase irmã,

Estou sentada à cozinha esperando que a máquina de lavar esvazie, para que eu possa abrir a torneira novamente (sim, ela tem problemas, é temperamental - se fica aberta a torneira, alaga a área de serviço). À minha frente meia caneca de café, duas revistas de pintura em tela e, apoiada no galão de água, uma tela em branco me olha. Permaneço contemplando-a, a decidir o que, afinal pintarei ali. Enquanto isso, meus pensamentos fogem em uma de suas viagens constantes, sem aviso nem sinal, param num desenho feito por você há anos - um bichinho charmoso com as mãos atrás do corpo, pelo qual me apaixonei incontinenti. E do personagem, claro, é um pulo pra você. E me lembro que, em menos de dois meses você completará 45 anos (tudo bem, não me esqueço que, inevitavelmente, chegarei lá primeiro!) e penso que poderia, de algum modo, enviar-lhe um presente que diga do meu amor e da minha amizade. E penso em talvez customizar uma camiseta pintando o Lully e colocando fitas, botões, sei lá - e mandar, via correio, pra você. Fatalmente me questiono se você gostaria, se usaria, como se veste hoje, que cores prefere neste momento da sua vida, que músicas embalam seus sonhos (sim, mesmo aos quarenta sonhamos, não?), o que faz nas horas de lazer, se continua desenhando (minha inveja absoluta de você - inveja boa, que fique claro!!!), se fala alemão, russo ou mandarim, se gosta de sentar-se só, com o pés sob o corpo e uma xícara de chá à frente e viajar, como eu, por lugares e tempos insondáveis, se plantou uma árvore, se escreveu um livro, se sente falta de filhos...
... e me dou conta de que hoje, afinal, vivemos mais tempo longe uma da outra do que o que passamos juntas, e percebo enfim a enormidade do sentimento que me une à você, e me questiono se um dia ainda nos encontraremos e sentaremos num boteco num fim de tarde tomando uma e olhando a vida passar... (re)descobrindo aos poucos a beleza da amizade que hoje é só um acalanto pro coração... falando de amores, de tristezas, de sonhos (realizados ou não), falando besteira ou mesmo partilhando o silêncio... quiçá um dia possamos.
A máquina parou, e já são 07:45 de uma manhã ensolarada em Valença, numa quarta feira, 22 de julho do ano da graça de Nosso Senhor de 2009 - e infelizmente ainda preciso me arrumar e ir pro trabalho porque não arrumei um marido rico, não ganhei na mega sena...
Mas pensando na distância e no tempo que nos separam, preparo aqui uma pequena lista de coisas que gosto e não gosto... pra que você possa ter uma idéia de como o tempo passou pra mim. Devolva-me a sua lista, ok? Pra que eu saiba também como o tempo passou pra você...
Do que eu gosto?
- de dias de sol (lembra quando a gente largateava no pátio da reitoria?)
- da feira de artesanato do Largo da Ordem em domingos de sol
- de almoçar no Bar do Alemão em domingos de sol em Curitiba
- de artesanato, de pintura, de reciclagem
- de andar nua pela casa
- de viajar
- de plantas pela casa
- de plantas no prato (amo salada!)
- do mar
- de ler
- de escrever
- de bom humor
- de deitar na rede na casa de Cloé olhando o mar e ouvindo o vento nos coqueiros
- de sentar no Boteco do Serginho com o Wan tomando Original e comendo costelinha de porco
- da família reunida
- de boteco com meus irmãos
- de quando eles ligam, bêbados, só pra passar vontade porque eu não tô junto
- de MPB
- de churrasco do Wan (com direito à trilha sonora sertaneja, claro!)
- de cozinhar
- de cantar alto junto com o som em manhãs de faxina da casa
- de jogar Imagem e Ação com meus filhos
- de jogar truco com meus filhos
- de jogar pôquer com meus filhos
- de qualquer coisa com meus filhos - gosto, amo estar com eles.
- de fotografia - fotografar, não ser fotografada
- de scrapbook
- de rever amigos
Do que eu não gosto?
- de mentira
- de pagode (tá, tudo bem, até danço... quando bebi umas...)
- de funk
- de frio
- de coentro
- de dormir com luz acesa
- de Salvador em dias de chuva
- de preconceito idiota (e sim, acredito que todo preconceito é idiota)
- de passar roupa
- de pessoas indecisas
- de pessoas que se acham
- de arrumar a cozinha após o almoço
- de sentir medo
- que me digam como agir
- de me sentir perdida
- de coração de galinha (nem fígado, nem moela, nenhum tipo de vísceras - e isso inclui sarapatel, fatada, xinxins e afins)
Posso pensar em muitas outras coisas pra colocar nesta lista... mas ela se tornaria ainda maior, e mais chata, e... melhor deixar pra quando estivermos juntas, em Barcelona ou Salvador, redescobrirmos...
Beijabraço grandenorme da amiga (de sempre),
Lu.

"E seus sonhos, quais são?"

"Liberdade! Palavra que o sonho alimenta, que não há quem explique e ninguém que entenda..."(Cecilia Meireles) Segundo dia de atestado médico, gripe (não suína), em casa. Hoje dormi menos do que ontem, não sei se já me acostumei ao remédio, não sei se estou menos debilitada. Fico ON no MSN, coisa rara, pra atender a primogênita que solicita uma 'conversa séria' (penso que vou levar uma baita bronca!). E vem falar comigo um querido, muito querido amigo, ex-cunhado, que traz no seu perfil os dizeres acima - quem sabe talvez um sinal. Conversamos muito, não o suficiente pra matar a saudade, mas o bastante pra nos sentirmos recarregados neste sentimento de amizade que nos une. E aí, do nada, ele me pergunta: "Pois é, minha cara e elegante amiga, e seus sonhos, quais são? Metas, planos..." Fico sem resposta, e isto me assusta. Muito, aliás. Paro um pouquinho e penso no que aconteceu agora, neste exato momento em que ele me pergunta e não tenho respostas: como me sinto? Reconheço-me? Sou eu esta pessoa que não sabe falar sobre seus próprios sonhos, metas, planos? Tá, tudo bem. Sei que nunca fui de ter sonhos grandiosos, metódicos ou impossíveis - sonhei ser mãe, o primeiro sonho que me lembro - e realizei-me. Sonhei contar histórias e, mesmo de maneira não tradicional, realizo-me. Sonhei morar na praia, junto ao mar. Sonhei ter amigos - na acepção exata da palavra, mesmo que não fossem numerosos - e me realizei. Sonhei ver meus filhos crescerem, tornarem-se pessoas especiais, sermos amigos. E me realizei. E agora? Cadê meus sonhos? Como posso buscar algo se não sei o que buscar???? Sei que meus sonhos estão aqui, em algum lugar. E vou procurá-los pensando no que meu amigo disse, antes de se despedir: "E não esqueça de que nós é quem somos donos da nossa história - quem a escreve somos nós." Se gosto de contar histórias, não posso me esquecer de que a principal é a minha. É dela, afinal, que partem todas as outras - imaginárias ou não, que me proponho a contar. Então, com licença, que eu vou ali vasculhar sob os escombros do passado, pra ver se encontro meus sonhos escondidos, observando atentos - com medo do futuro. E vou resgatá-los, com toda sua importância na minha vida.